terça-feira, 2 de agosto de 2011

Rua Chile - Anos 50

Temos um interessante panorama da Rua Chile nos anos 50 (século XX) através dos relatos da Museóloga Ana Maria Carvalho de Azevedo:


Chegamos, finalmente, à rua Chile, das lojas mais elegantes, freqüentadas pela boa sociedade e onde se encontravam os mais finos artigos e também, é claro, os últimos lançamentos da moda. Logo no início, à esquerda, havia uma lanchonete, “A Gruta de Lourdes”. Era a penas um corredor largo, onde se lanchava, de pé junto ao balcão, o melhor pãozinho da cidade.

A Casa Clark era uma sapataria onde nós comprávamos os sapatos escolares. Todo início de ano fazíamos essa visita obrigatória para levar um sapato preto de pelica, com pulseira, para não sair do pé, e muito forte para agüentar as traquinagens de um ano inteiro. Em seguida ficava a Livraria Civilização Brasileira, que se acabou num grande incêndio.

Bahia Illustrada, 1918.

Arquivo Nelson Cadena

A Casa Sloper, um sonho de coisas lindas, sempre com as novidades em bijouterias, bolsas, sapatos, vendia também vestuário para senhoras e crianças, além de roupas de cama e mesa, artigos para presentes e perfumaria. O que mais me encantava era uma seção de beleza onde uma especialista, rodeada de frascos contendo vários tons de pó-de-arroz, misturava-os, de acordo com a tonalidade da pele da cliente. Uma coisa finíssima e muito chic!



Arquivo Nelson Cadena

A Etam, uma loja de artigos femininos, lingerie e vestidos lindos, ao estilo americano, que era a moda da época. A gerente, uma estrangeira de sotaque carregado, tinha um sistema de controle muito original, com muitas etiquetas coladas numas folhas de papel. Tudo isso, numa época em que não se precisava correr como hoje, era motivo de distração.

A Loja Duas Américas era um verdadeiro magazine, onde se encontravam todos os tipos de mercadoria. No andar térreo ficavam os tecidos e os vendedores colocavam cadeiras junto ao balcão, para o conforto dos clientes, se a compra era mais demorada. Nos outros andares estavam os artigos infantis, bolsas e sapatos, cama e mesa, decoração e a sua atração principal que era a elegante sala de chá; que funcionava no seu último andar. Na década de 50 era o lugar mais fino e bem freqüentado da cidade. Era um local agradável, onde se podia tomar um lanche requintado, encontrar amigos e ainda assistir às atrações locais. Foi a primeira loja a instalar escada rolante, do térreo para o primeiro andar, e com isso nos equiparamos ao Rio de Janeiro e São Paulo.

Bahia Illustrada, 1918.


Na Casa da Música se encontravam partituras e instrumentos musicais, radiolas, artigos para presente em prata, cristal e louça, bolsas de festa, as “trousses” e todas as tardes havia um pianista tocando para os clientes; no 2º andar estavam os discos e diversas cabines para o cliente ouvir o disco escolhido e ver se estava em boas condições, além de lingerie para senhoras; no 3º andar ficavam os brinquedos.

Outras Lojas como A Nova América, Casa Africana, Sapataria Elite, Chapelaria Baiana, Farmácia Chile, Casa Alberto, Ótica Baiana, A Moda, Confeitaria Chile faziam parte desse percurso tão encantador.

Para se ir à Rua Chile era preciso uma preparação em grande estilo. Vestidos de passeio, sapatos de salto e meias de seda, com a costura bem certinha. As garotas usavam vestidos de corpo cintado e saias amplas, armadas pelas anáguas cuidadosamente engomadas. Esses modelos eram copiados dos filmes americanos e do figurino “Lana Lobell”, não se podia seque imaginar vestir uma calça comprida. As jovens usavam cabelos presos em “rabo-de-cavalo” ou no corte da época “taradinha”. Quando se ia à sala de chá, usavam-se até luvas. Antes dos 15 anos as meninas não usavam salto nem batom.

Os rapazes geralmente usavam calça de gabardine ou tropical e camisa esporte, nas padronagens masculinas, sempre em cores sérias; calça jeans e camisas de qualquer cor não estavam ainda em moda; tênis, nem pensar. Os cabelos eram no corte “maracanã”, ou ainda penteados com brilhantina. 

Os rapazes ficavam conversando nos passeios ao longo da rua e as moças passavam de uma loja para outra. Era a oportunidade de namorados ou amigos se encontrarem, ou então somente fazer parte do eterno jogo do flerte, atual paquera.

No passeio ao lado do Palácio Rio Branco ficavam os mais velhos, conversando sobre negócios e aproveitando para olhar as moças e dirigir-lhes galanteios. Às vezes, recebiam respostas desaforadas como “Quem gosta de velho é reumatismo”. Também ficava um fotógrafo “lambe-lambe” que ia registrando instantâneos transeuntes.

 Já no final da rua, chega-se à Praça Municipal com a Sorveteria Cubana, que ainda hoje funciona na entrada do Elevador Lacerda. Na época possuía mesas e cadeiras por toda a extensão das calçadas que dão para a maravilhosa Baía de Todos os Santos. Essa sorveteria fazia parte do final de uma tarde de compras ou de uma seção de cinema aos domingos. O “milk-shake” com bolinhos e o “dust-miller” eram os melhores da cidade e também uma oportunidade de encontro para a juventude. 

No térreo do Hotel Palace, dando para a rua da Ajuda e rua Chile, encontra-se a loja Adamastor, que resiste até hoje. Na década de 50, era uma das melhores em artigos masculinos e tinha o que havia de mais moderno para os rapazes. O Hotel Palace também tinha uma sala de chá, na qual houve um comentado crime: um rapaz que era muito arruaceiro e já vinha ameaçando um outro, nessa tarde se encontram e o desacato acabou com a morte do agressor e o que atirou não foi condenado, porque alegou legítima defesa. 




2 comentários:

  1. Fantástico resgatar essa história, memórias e fotos dos tempos áureos da Rua Chile! Senti falta de se comentar sobre a Mulher de Roxo, um verdadeiro mito da história de nossa cidade que vivia nesse lugar.

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