quarta-feira, 8 de abril de 2015

A casa das Sete Mortes, por Silva Campo (1930)

O prédio número vinte e quatro da rua do Passo, sobrado de um andar, com o frontispício revestido de azulejos […]. Reconstruiram-no em 1889, segundo um mármore existente ao alto da vêrga da porta […].

Mas, porque Casa das Sete Mortes?

No tempo que se passou o facto que vou narrar, a rua do Passo não era mais que uma trilha escassamente habitada, marginada por espêsso matagal, de onde emergiam ramalhudas árvores. Ainda não existia a igreja matriz e, muito menos, pois, a larga escadaria que sobe da ladeira do Carmo.

A casa em aprêço, várias vezes modificada no correr dos anos, era o solar de apatacado lusitano. Mais adeante residia outro portuguez, dono de um cachorro de estimação, sobremaneira brabo. Certa feita, ao passar com o seu molosso pêla casa do vizinho, o animal investio furiosamente contra um escravo daquele, e o negro defendendo-se, matou-o. Sem nenum protesto, o senhor do cadelo tornou-se á sua morada, tomou de acerada lamina, e foi invadir a casa do patrício, inopinadamente, esfaqueando quantos topou, sem esguardar sexo, nem idade, nem condição. Assim, o truculento reinol perpetrou ste cruais assassínios.

Esta tradição, diz-me J. Teixeira Barros, ouviu-a o actual locatário do prédio em lide da bôca de velho artista, septuagenário, quando este, há anos, o reparava, dizendo saber do caso por imformação de seus avós.

Ouçamos, agora, o que nos conta Melo Moraes, pae, no Brazil histórico, relativamente á tradicional casa.

No meado do século XVIII o proprietário do sobrado estava em renhida demanda com o ajudante ás ordens do vice-rei, o qual entendeu de pôr fim á mesma eliminando o contendor. Uma noite, achando-se a familia a cear, os mandatários do crime entraram, trucidando o casal e os filhos, em número de sete pessoas. Só escapou uma mulatinha, escrava da casa, a qual se escondeu dentro do forno, ainda quente, dele não saindo senão quando ouviu cessar todo o rumor. A voz do povo acusou unanimamente o mencionado ajudante, o qual foi preso, mas porque não se encontrassem provas nos autos para a sua condenação, restituiram-lhe a liberdade.


 SILVA CAMPOS. João da. Santo Antonio de Campo Formoso. In: _____. Tradições Bahianas – Separata da Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia nº 56, 1930. Bahia: Secção Graphica da Escola de Aprendizes Artífices, 1930, p. 51-54.

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