Embora
já existissem desde a década de 1870 alguns exemplos de reformas de edificações
existentes e de construções ex-novo com características da
arquitetura eclética, é somente a partir da década de 1910 que o eclético se
torna a linguagem arquitetônica oficial do poder público e do poder econômico,
com as mais imponentes e significativas construções de Salvador sendo objeto de
reformas internas e externas, nas quais as características ligadas ao passado
colonial português eram suprimidas e substituídas por uma ornamentação eclética
com referências simultâneas às diversas vertentes histórico-geográficas da
arquitetura européia, como o barroco francês ou o renascimento italiano.
A década de
1910 coincide também com a chegada, em Salvador, de diversos engenheiros,
arquitetos e construtores estrangeiros, principalmente italianos, que vão se
ocupar da construção dos novos edifícios institucionais e da renovação dos
antigos palácios e sobrados coloniais, ao mesmo tempo em que erguem os
palacetes da nova burguesia baiana, financiados com os recursos oriundos da
atividade industrial e das plantações de fumo do Recôncavo e de cacau do sul da
Bahia.
Segundo
Godofredo Filho (1984, p. 15), essa renovação arquitetônica e artística se deve
principalmente aos “técnicos italianos aqui chegados a partir de 1912, no 1º
Governo Seabra, quando o Secretário Geral Arlindo Fragoso e, sobretudo, o
Intendente Júlio Viveiros Brandão, buscaram abastecer-se em São Paulo, de
arquitetos, escultores, pintores, decoradores e artesãos especializados, com o
fito de mudar, como pretenderam e em parte conseguiram, a grave e tranqüila
fisionomia plástica de Salvador”:
Os Chirico,
os Conti, os Santoro, os Rossi, os Sercelli e tantos outros, diferentes entre
si nos misteres e nos méritos, trabalharam com afinco, brindando a cidade ora
de bronzes e mármores duradouros, ora de pinturas de salão mundano em igrejas
austeras e, ainda, em edifícios públicos e particulares, da glace caricatural
dos estuques, as grinaldas, os festões, as águias de bico voraz e asas abertas,
e, até, de mulheres aladas ou de corpo natural inteiro, todas elas de seios
duros e pontudos ede Dânae de Corregio, por onde se pudessem modelar, acaso, as
taças cônicas das festanças inaugurais. (GODOFREDO FILHO, op. cit., p. 15)
Dentre os arquitetos, engenheiros e construtores italianos
que atuaram, ainda que temporariamente, em Salvador entre as décadas de 1910 e
1920 podemos destacar: Júlio Conti, responsável pela versão original do projeto
de reconstrução do Palácio Rio Branco, iniciada em 1912, pela nova Igreja da
Ajuda, construída entre 1912 e 1923, e pela construção do Instituto Geográfico
e Histórico da Bahia, também inaugurado em 1923 (PUPPI, 1998, p. 129); Alberto
Borelli, que chegou a Salvador, procedente de São Paulo, em 1912 e que foi
autor do projeto do Gabinete Português de Leitura, inaugurado em 1918 (ibid.,
p. 107); e Michele Caselli, autor do projeto original da nova Igreja de São
Pedro da Piedade, datado de 1914 e não executado.
Alguns
destes profissionais estavam sediados no Rio de Janeiro, onde eram bastante
atuantes, tendo realizado poucas obras em Salvador, como Antonio Virzi, que
elaborou, em 1914, um projeto para o novo Teatro Municipal na Praça Castro
Alves e que teve apenas suas fundações concluídas; e Raphael Rebecchi, autor do
pavilhão da Bahia na Exposição Internacional de 1908 no Rio de Janeiro e que executou
alguns projetos em Salvador na década de 1920, tal como a sede do Banco Francês
Italiano no bairro do Comércio e uma agência telegráfica no Largo da Barra
(PUPPI, 1998, p. 102).
Entretanto,
os dois principais projetistas italianos atuantes na Bahia neste período foram,
certamente, Rossi Baptista e Filinto Santoro. Ao contrário da maioria dos
projetistas anteriormente citados, que estavam sediados no Rio de Janeiro ou em
São Paulo e desenvolveram esporadicamente projetos para Salvador, tanto Rossi
Baptista quanto Filinto Santoro tiveram intensa atuação na capital baiana a
partir da primeira metade da década de 1910 e pelo menos até o início dos anos
1920.
Rossi Baptista estava originalmente sediado no Rio de Janeiro e o primeiro projeto elaborado por ele para Salvador é o do Palacete do Comendador Bernardo Martins Catharino (1911-1912), na Rua da Graça. Paulo Ormindo de Azevedo, em seu detalhado levantamento da produção arquitetônica de Rossi Baptista em Salvador (AZEVEDO, 2006), afirma que Rossi Baptista projetou, reformou ou construiu pelo menos 32 edifícios na capital baiana entre 1911 e 1933.
Segundo
Azevedo, sua atuação se concentrou basicamente em duas frentes: novos edifícios
comerciais ou reformas de edifícios existentes na área consolidada da cidade,
principalmente no bairro do Comércio e na Rua Chile; e novos edifícios
residenciais para a burguesia em ascensão, nos bairros da expansão urbana
meridional, principalmente Canela, Graça e Barra.
Dentre os
seus projetos mais importantes, além do Palacete Martins Catharino, destacam-se
uma outra residência construída para o mesmo cliente na Rua do Canela, nº 08
(1912), que abriga atualmente a Escola de Teatro da Universidade Federal da
Bahia (UFBA); a sede da Associação dos Empregados do Comércio (1914-1917), na
esquina da Rua do Tira Chapéu com a Rua Chile, que é certamente um dos mais
significativos edifícios baianos do período; o chalé construído como residência
de Otávio Ariani Machado, na Rua do Canela, nº 03 (1926), que atualmente abriga
a Residência Universitária Feminina da UFBA; e a antiga sede do Bank of London
& South America na Rua Miguel Calmon, no Comércio (1928), que atualmente
abriga um bingo (AZEVEDO, 2006, pp. 71-75).
Rossi Baptista foi ainda o responsável pelo novo projeto e pela construção da nova Igreja de São Pedro da Piedade (1916-1917), após desentendimentos entre Michele Caselli, autor do projeto original, e a Mesa da Irmandade do Santíssimo Sacramento (ALMEIDA, 2006, p. 101).
Porém, ao
contrário do que afirma Paulo Ormindo de Azevedo, Rossi Baptista não foi o
único projetista italiano radicado em Salvador naquele período. A partir de
1913 e pelo menos até 1920, o engenheiro napolitano Filinto Santoro não somente
residiu na Bahia como foi o projetista oficial do Estado, concebendo e
executando algumas das principais obras públicas da cidade de Salvador. Se no
período do apogeu da arquitetura eclética na Bahia – correspondente às décadas
de 1910 e 1920 – Rossi Baptista foi o projetista preferido da burguesia
industrial em ascensão, desenhando e construindo as suas residências e as sedes
das suas empresas, Filinto Santoro foi o projetista do poder político,
responsável por diversos edifícios públicos e equipamentos urbanos produzidos
em Salvador a partir de 1913 e, principalmente, durante a gestão de Antônio
Ferrão Muniz de Aragão (1916-1920) à frente do Governo Estadual."
Nivaldo Vieira de Andrade Júnior
ANDRADE JUNIOR, Nivaldo Vieira de Andrade. A Influência Italiana na Modernidade Baiana: o caráter público, urbano e monumental da arquitetura de Filinto Santoro. 19&20, Rio de Janeiro, v. I, n. 4, out. 2007. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/arte%20decorativa/ad_fs_vnaj.htm>.
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